2004-09-30 - Direitos ao assunto!

30-09-2004 16:57

A propósito da entrada em vigor do novo Código da Insolvência e de Recuperação de Empresas (CIRE), “acabadinho” de entrar em vigor, julgo importante a divulgação de alguns dos seus aspectos fundamentais. Cada vez mais se assiste (o que é infelizmente normal em tempos de crise) a sujeitos individuais ou colectivos que se subtraem aquilo que são no dizer do legislador “indeclináveis deveres” de quem intervém no tráfego jurídico exercendo uma actividade comercial, maxime, honrar compromissos assumidos. Sob pena de se alastrar este clima de impunidade que se repercute obrigatoriamente na vida económica e financeira de agentes de boa fé, foi importante que se revisse esta legislação. Não diria que se alcançou a perfeição, podia ter-se avançado muito mais, mas a verdade é que a declaração de insolvência ficou facilitada, com um papel reforçado por parte dos credores e as consequências para os “falidos” foram agravadas, quer a nível de publicitação, quer mesmo ao nível das condutas susceptíveis de constituir crime.

Deixa de haver dois processos especiais de falência e recuperação para passar a existir só um, o da insolvência. O processo fica mais célere. Quantas “recuperações de empresas” não eram mais que adiamentos “pensados” da inevitável falência! Deixa de existir gestor e liquidatário judicial para passar a haver só uma figura, a do administrador da insolvência, que agora volta a ser nomeado pelos credores. O Juiz velará pela legalidade do processo que passa a ser muito menos judicial. Inclusive, permite-se a pessoas singulares a apresentação no processo de um “plano de pagamentos”, onde o próprio Juiz pode intervir viabilizando acordos “extrajudiciais”, suprindo assim diferenças não conciliatórias que, por vezes, não interessam a ninguém... O Juiz já não tem que se pronunciar sobre a recuperabilidade da empresa, tão somente declarar a insolvência. Já não se podem impugnar junto do Tribunal as deliberações da comissão de credores, bem como os actos do administrador da insolvência. Estabelece-se a presunção de culpa grave para os administradores que não declarem a sua insolvência nos prazos legais; o caracter urgente dos apensos da insolvência, bem como dos registos de sentença e despachos; uma única fase para a citação de credores; a insusceptibilidade de suspensão do processo. Simplificando a pluralidade de pressupostos objectivos da insolvência, assenta-se agora tão somente na “impossibilidade de cumprir obrigações vencidas”, todavia, recuperando o critério específico do “passivo superior ao activo”, desde que nenhuma pessoa singular responda pessoal e ilimitadamente. Os indícios da insolvência são alargados. “Presume-se a má fé das pessoas especialmente relacionadas com o devedor que hajam participado ou tenham retirado proveito de actos deste, ainda que a relação especial não existisse à data do acto”. No plano penal, agravam-se as penas, “quando da prática de tais ilícitos resultar a frustração de créditos de natureza laboral”. Aqui, julgo que se poderia avançar muito mais, nomeadamente na denúncia e intervenção de outros sujeitos que não só o Ministério Público, para a efectiva condenação em processo penal. Já “chateia” a muita gente o “chavão” de que não há prisão por dívidas…

Em nome da eficácia, celeridade, o que equivale a justiça, reforça-se a publicitação do processo para tanto, juntando aos conhecidos meios, o registo civil para pessoas singulares, o registo informático de execuções, a página informática do Tribunal, bem como a comunicação ao Banco de Portugal. O que poderá vir a ser curioso de facto, chegando a roçar o ridículo, será o noivo(a) pedir uma certidão de nascimento para instruir um casamento e o “outro(a)” desistir da ideia depois de ler os averbamentos pouco abonatórios da capacidade de gestão daquele. Não teria sido mais simples ajustar esses averbamentos no domínio fiscal, no cartão de contribuinte tão só?

Porque não temos mais espaço e temos que concluir, deixem-me expressar tão só um desejo: pacificação social!

 

--

José Augusto de Jesus