Se fosse só a falência das finanças…

05-11-2012 17:46

Há algumas semanas atrás ouvi o presidente da câmara do Cartaxo anunciar publicamente, de forma muito tranquila, a falência da sua autarquia. Confesso que fiquei chocado com a ligeireza do anúncio. Foi como se estivesse a anunciar que a lâmpada do candeeiro de uma qualquer rua do concelho estivesse fundida, e por isso iria ser substituída.  

 

De repente o Cartaxo vê-se a mendigar ao governo da Nação um resgate financeiro que nos vai custar a todos mais de 74 milhões de euros, a pagar em 20 anos; os impostos e taxas municipais vão ser elevados para valores máximos para que possamos pagar o que nos vão emprestar; a câmara deixa de ter qualquer possibilidade de fazer mais do que assegurar serviços mínimos; e passa-se a mensagem que não é nada de mais! É tudo normal!

 

Bem sei que são muitos anos de poder absoluto, com uma gestão caprichosa, suportada por uma maioria política confortável, em que tudo foi permitido, onde a voz dos mais cautelosos foi sendo constantemente ignorada… mas há limites!


Assumir um desequilíbrio estrutural financeiro do município do Cartaxo, vulgo falência, e atirar que a culpa é da crise internacional, da crise nacional, do desemprego e da curva ascendente de investimentos significativos do concelho é, no mínimo, um abuso! A câmara do Cartaxo ultrapassou os limites do endividamento a médio e longo prazo, o endividamento líquido é superior a 175% das receitas municipais, não se cumpre com a obrigação de redução desse endividamento, o prazo médio de pagamento a fornecedores é superior a seis meses. Dito de outra forma: quem teve responsabilidade de gerir a câmara, sobretudo nos últimos anos, gastou o que tinha e o que não tinha! E o que não tinha foi pedi-lo emprestado aos bancos, tirou do bolso dos seus fornecedores, não cumpriu protocolos com as coletividades, com as freguesias, etc.. E a culpa é da crise???

 

Sei bem que a legitimidade democrática é intocável, respeito-a por completo mas isso não me impede a mim, como não impedirá ninguém, de ter um sentido crítico e expressá-lo. E é tempo de o expressar mesmo! Basta! Basta de caprichos!

 

Não nos bastava a austeridade severa a que o país está exposto, agora teremos ainda mais austeridade em cima. Vai-nos sair do bolso a todos com certeza! Vamos passar 20 anos a pagar mais de 74 milhões de euros, 20 anos em que o progresso do concelho vai ficar congelado.

 

O desequilíbrio financeiro estrutural da câmara do Cartaxo é atestado por entidades que tutelam as autarquias locais. Foi assumindo tal desequilíbrio, apesar da ligeireza, porque quem hoje tem a responsabilidade do governo do município. O plano de reequilíbrio financeiro aprovado pela assembleia municipal contempla os números e os prazos que acima referi. Não posso por isso compreender como é que o anterior presidente da câmara do Cartaxo, há alguns dias atrás, respondeu numa entrevista que: “É uma dívida que tem perfeitas condições para ser paga, sem afetar gerações futuras, num prazo máximo de 10 anos, toda ela.”

 

Há quem não assuma, com estranha coragem, o estado dramático a que este concelho foi votado. Há quem assuma esta falência com total ligeireza. E há ainda quem, com estranha falta de coragem, permaneça mudo e calado.

 

E perante tudo isto, e para concluir, arrisco a dizer que não se trata só da falência das finanças da câmara. É também a falência de um projeto político em que uma maioria depositou confiança.

 

São outras lâmpadas fundidas… A solução, essa, deverá ser a mesma!

 

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José Augusto de Jesus